Inovação poderá embalar Brasil futuro
Por Sergio Leo
O governo, aflito com a perda de competitividade da indústria nacional, não
tem se limitado às benemerências abençoadas no Palácio do Planalto, envolvendo
redução de impostos e, mais recentemente, cortes no preço da energia elétrica.
Um trabalho bem menos visível, está em curso, e, por enquanto, se esconde sob o
batido e pouco entendido rótulo de "inovação", sob a exótica categoria da
"nanotecnologia". O Brasil, gigante produtor de alimentos, poderá se beneficiar
da novidade.
"O certo não seria falar em nanotecnologia, mas nanotecnologias", diz o
diretor do Departamento de Tecnologias Inovadoras do Ministério do
Desenvolvimento, João Batista Lanari Bó. Há diversas tecnologias agrupadas sob o
nome de nanotecnologia, unidas apenas por sua escala microscópica: são engenhos
humanos, criados com milionésimos de milímetro, aplicáveis às mais variadas
áreas da indústria, da química ou da medicina, capazes de alterar a propriedade
dos materiais. O ministério começa a sair do terreno das especulações sobre o
tema, para incentivar as empresas a abraçarem essas novas tecnologias - nada
microscópicas, quando se trata de medir seus possíveis ganhos.
Após reuniões entre potenciais interessados e a contratação de uma empresa de
consultoria especializada, o governo está perto de provar que é possível
escolher uma rota tecnológica inovadora e montar um modelo de negócios factível.
O setor escolhido foi o da indústria de embalagens, essencial para a
competitividade das exportações do país, onde a nanotecnologia pode permitir a
criação de produtos mais resistentes, esterilizados ou inteligentes - capazes de
avaliar e indicar ao consumidor o estado da mercadoria embalada, por
exemplo.
Projeto oferecido pelo governo deve inspirar
empresas
A indústria de plásticos, recentemente beneficiada por aumento de barreiras
contra a concorrência importada, foi o alvo escolhido pelos técnicos do governo
para a primeira iniciativa. É um setor onde há pouquíssimas empresas no início
da cadeia produtiva, na produção de resinas plásticas (setor quase totalmente
dominado por uma grande firma, a Braskem), e, na ponta final, cerca de 12 mil
fabricantes de produtos de plástico. Em uma ponta, os negócios têm de ter uma
escala monumental para atrair a atenção e interesse dos executivos; na outra, o
reduzido tamanho das empresas as deixa muito pouco dispostas a riscos e
investimentos em novas tecnologias.
O governo assumiu, então, um papel geralmente desempenhado pelos próprios
empresários, e, após reuniões de trabalho com o setor privado, financiou a
primeira fase de um estudo de viabilidade para a instalação de uma indústria de
produtos plásticos com nanotecnologia destinados a embalagens. "Começamos
falando em nanotubos de carbono, para embalagens da indústria eletroeletrônica,
mas o Brasil é grande exportador de alimentos, onde temos de inovar na cadeia
produtiva", comenta o coordenador do estudo, encomendado à consultoria
Nanobusiness, Ronaldo Pedro da Silva.
"No país, 40% do que se consome em embalagens é para alimentos; está aí um
baita mercado", resume o especialista. O "baita" mercado da indústria de
embalagens reúne cerca de 230 empregos e tem faturamento estimado, neste ano, de
R$ 46 bilhões, cerca de 5% acima da receita gerada em 2011. O setor de plásticos
ocupa mais da metade do pessoal nessa indústria e participa com 40% do total de
suas exportações.
O resultado do estudo encomendado pelo ministério já interessou uma holding
do setor a bancar os passos seguintes do que pode se transformar numa fábrica de
insumos nanométricos para a indústria de embalagens plásticas. Ou, em português
corriqueiro: uma fábrica que produzirá uma espécie de pasta com componentes de
argila em escala microscópica, a serem misturados às resinas plásticas, para
criar embalagens mais resistentes, mais duráveis, mais impermeáveis, ou com
capacidades antimicrobianas e antioxidantes. Um material capaz de enfrentar as
crescentes exigências técnicas que os países desenvolvidos vêm impondo às
importações, especialmente de alimentos.
O estudo, que necessita, obviamente, de aprofundamento para orientar, de
fato, a criação de uma fábrica, evitou delírios desenvolvimentistas e adotou
hipóteses conservadoras. A nanoargila foi escolhida por ser um material com
facilidade de domínio da tecnologia e um mercado sem concorrentes dominantes,
aberto a empreendedores.
Os estudos preliminares, que agora são discutidos seriamente pelo ministério
com os empresários interessados, indicam a possibilidade de criação de uma
fábrica de custo relativamente baixo e retorno alto, para produzir esse material
a ser usado pela indústria plástica na melhoria das embalagens.
O mercado estimado é de até R$ 40 milhões anuais até 2016, os custos de
instalação e operação (Capex e Opex, na terminologia dos planos de negócio)
ficam em até R$ 29 milhões, pelas hipóteses mais conservadoras, nos primeiros
cinco anos. Com financiamento do BNDES, pelo PSI, o carinhoso programa de apoio
a investimento do banco, o investidor terá uma taxa de retorno entre 40% a 63% e
recuperaria o capital em cinco anos e meio. É um negócio modesto, que pode
trazer melhorias a uma cadeia produtiva de dezenas de bilhões de reais;
O exercício microeconômico serve para mostrar que nem tudo que se pode fazer
pela competitividade da economia nacional ganha cerimônia e fanfarra nos
palácios oficiais. O grupo de inovação do ministério explora também as
possibilidades da nanotecnologia na exploração de petróleo, que será um dos
temas de um seminário em outubro.
A escala microscópica desse tipo de tecnologia pode, quem sabe, inspirar o
setor privado a se armar de lupas e investigar novas oportunidades, além das
ações do governo, que surgem contra a armadilha da falta de
competitividade.
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