Diante da possibilidade de o Poder Judiciário aplicar a seus funcionários as
regras previstas na Lei da Ficha Limpa, integrantes do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) manifestaram ontem preocupação de o órgão de controle externo
eventualmente extrapolar suas funções e acabar legislando sobre a nomeação ou
não de servidores.
A proposta de aplicar a legislação para tribunais já recebeu três votos
favoráveis - do relator, Bruno Dantas, e dos conselheiros Marcelo Nobre e Jorge
Hélio. Mas o futuro presidente do CNJ, ministro Carlos Ayres Britto, que
presidiu a sessão plenária de ontem, alertou sobre a eventual falta de
fundamentação jurídica da proposta. A discussão foi interrompida por um pedido
de vista do conselheiro Tourinho Neto. O CNJ deve retomar a discussão dentro de
duas sessões.
A proposta prevê, por exemplo, que servidores em cargos em comissão ou de
confiança em tribunais só poderão permanecer em suas funções se não tiverem
contra si condenações por órgão colegiado e em segunda instância por crimes
previstos na Lei da Ficha Limpa. O projeto em debate estabelece o prazo de até
90 dias para a exoneração desses servidores não concursados e proíbe a renovação
de contratos com empresas que atuam por meio de terceirização nos tribunais e
que tenham entre seus funcionários condenados pelos crimes da Lei da Ficha
Limpa.
Na abertura das discussões, Ayres Britto se disse "preocupado com o aspecto
legal da questão". Ele relembrou que o inciso 9º do artigo 116 da Lei nº 8.112,
de 1990, que institui o Regime Jurídico dos Servidores Públicos, já estabelece
entre os deveres do funcionário público manter "conduta compatível com a
moralidade administrativa". Para o magistrado, o papel do CNJ não precisa ser o
de listar, de imediato, situações para o preenchimento de um cargo no
Judiciário, mas sim o de atestar que a norma jurídica aplicada no artigo 116
deve ser interpretada também no contexto de moralidade estabelecido pela Lei da
Ficha Limpa.
"Deveríamos dizer que essa conduta, compatível com a moralidade
administrativa, deve ser interpretada e aplicada pelos tribunais na perspectiva
da Lei da Ficha Limpa. Teríamos uma base legal no âmbito federal, que seria o
artigo 116, e como condição de investidura no cargo, mas não estaríamos criando
uma lei propriamente", disse Ayres Britto.
O risco de o CNJ extrapolar suas funções também foi manifestado pelo
conselheiro José Lúcio Munhoz, que integrou a Comissão de Eficiência Operacional
e Gestão de Pessoas, grupo formado por três conselheiros para analisar
previamente a proposta de ficha limpa para o Judiciário. Embora tenha sido voto
vencido dentro da comissão, Munhoz conseguiu que o relator da proposta, Bruno
Dantas, retirasse do texto a obrigação de os Tribunais de Justiça enviarem às
Assembleias Legislativas projetos de lei para impedir, com base na Lei da Ficha
Limpa, a admissão de servidores e magistrados aprovados em concurso.
Para Munhoz, a atribuição de competência jurídica aos TJs para propor esses
projetos, poderia, por exemplo, ferir o princípio de separação entre os poderes
e provocar contestações judiciais. "Estou fazendo adaptações no voto e no texto
da resolução. Vou promover todos os ajustes e enviar novamente para os colegas",
disse Dantas após as ponderações dos demais conselheiros do CNJ.
Sancionada em 2010, a Lei da Ficha Limpa determina que não podem receber
registro para disputar cargos eletivos condenados em segunda instância e em
decisão colegiada por crimes como formação de quadrilha, lavagem de dinheiro,
abuso de autoridade, crime contra a administração pública e contra o sistema
financeiro.
Fonte:http://www.valor.com.br/brasil/2588302/cnj-analisa-uso-de-lei-da-ficha-limpa-no-judiciario?utm_source=newsletter_manha&utm_medium=27032012&utm_term=cnj+analisa+uso+de+lei+da+ficha+limpa+no+judiciario&utm_campaign=informativo&NewsNid=2587990
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